quarta-feira, 19 de novembro de 2008

"Agrotóxico na Terra dos Outros é Refresco"

O discurso e a prática das multinacionais químicas na reavaliação de agrotóxicos no BrasilPor Bruno Milanez, Marcelo Firpo de Souza Porto, Jean-Pierre Leroy, Julianna Malerba, Jeffer Castelo Branco, Marcio Antonio Mariano da Silva, Zuleica Nycs e Michael Søgaard Jørgensen ** O Brasil é o segundo maior consumidor mundial de agrotóxicos 1. Entre 2002 e 2007, o faturamento líquido do setor passou de US$ 1,9 bilhão para US$ 5,4 bilhões 2 e tudo indica que o crescimento deve continuar, graças ao fortalecimento do modelo exportador de commodities agrícolas, que, diferente da visão agroecológica, trata a biodiversidade como praga a ser combatida através do uso intensivo de agrotóxicos. O lucro, porém, fica na mão de poucos: apenas dez empresas respondem por 90% do mercado nacional 3 – Bayer (Alemanha), Syngenta (Suíça), Basf (Alemanha), Monsanto (EUA), Dow Chemical (EUA), Milenia/Makteshim Agan (Israel), DuPont (EUA), FMC (EUA), Nortox (Brasil) e Arysta (Japão). Por comercializarem produtos com grande impacto sobre a saúde e o meio ambiente, essas companhias têm procurado construir uma imagem forte e vêm se apresentando como social e ambientalmente responsáveis. Assim, algumas delas – Syngenta, Basf, Monsanto, Dow, Milenia e Dupont – integram o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, uma associação “criada com a missão de mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir seus negócios de forma socialmente responsável, tornando-as parceiras na construção de uma sociedade sustentável e justa”. Segundo o próprio Instituto Ethos, “responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona”4.Existe também um grupo mais seleto, formado por Bayer, Syngenta, Basf e DuPont, que participa do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), uma coalizão de empresas que tem por missão “integrar os princípios e práticas do desenvolvimento sustentável no contexto de negócio, conciliando as dimensões econômica, social e ambiental”. Para o CEBDS, o termo desenvolvimento sustentável significa “conciliar as necessidades econômicas, sociais e ambientais sem comprometer o futuro de quaisquer dessas demandas” 5.Uma terceira associação onde essas empresas têm igualmente um envolvimento ativo é o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola (SINDAG), a principal entidade representativa dos produtores de agrotóxicos do país. As empresas líderes do mercado possuem uma atuação de destaque dentro do SINDAG e ocupam posições importantes na diretoria, incluindo presidência (Syngenta), vice-presidência (FMC e DuPont), diretoria administrativa (Milenia) e diretoria financeira (Basf), assim como suplência (Bayer, Dow, Monsanto e Arysta) 6.Porém, apesar de tratar-se das mesmas empresas, a atuação do SINDAG parece pouco convergente com o discurso adotado pelo Instituto Ethos e pelo CEBDS. Um dos exemplos disso é a liminar*** obtida na Justiça no início do mês de julho último, que interrompeu o processo de reavaliação de agrotóxicos realizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da Saúde. A reavaliação é uma prática possível graças à constante inovação e pesquisa realizadas pelo setor químico e pelas áreas de saúde pública e meio ambiente. A partir de seus resultados, um agrotóxico poderia ser retirado do mercado por vários motivos: quando as pesquisas apontassem para novos riscos à saúde humana ou ambiental; sempre que fosse percebida uma perda de efetividade, em que os insetos ou ervas desenvolvem resistência ao veneno; ou ainda se produtos menos tóxicos fossem desenvolvidos para substituir os antigos. Além disso, ao contrário do processo de registro, nos quais as fabricante são as principais fornecedoras da informação sobre a toxicidade dos agrotóxicos, o procedimento de reavaliação conta com informações obtidas junto a instituições independentes. Iniciativas como essas permitiram ao governo proibir o uso de agrotóxicos como o DDT, em 1998, e o monocrotofós, em 2006. A redução contínua da toxicidade nesses produtos é uma estratégia fundamental para a diminuição dos casos de envenenamento químico no Brasil. Segundo o Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas, em 2006, os agrotóxicos de uso agrícola e doméstico foram, respectivamente, a segunda e terceira causa de intoxicações humanas no país, totalizando quase 9.600 registros, 17% acima do ano anterior 7. Estes dados, porém, representam apenas a ponta do iceberg, pois as estimativas indicam que para cada intoxicação por agrotóxico notificada, há outras 50 não comunicadas 8. A maior parte delas ocorre no campo, entre trabalhadores rurais, muitas vezes incluindo mulheres e crianças. Essa situação decorre da combinação de vários fatores, como a elevada toxicidade dos produtos, a forma irresponsável com que são vendidos, a falta de orientação adequada aos usuários e o baixo nível de informação e treinamento dos agricultores. Uma pesquisa realizada no norte do país mostrou que muitos agricultores desconheciam o código de cores utilizado para classificar o nível de toxicidade dos produtos (vermelho para extremamente tóxico, amarelo para muito tóxico etc). Além disso, mais de 75% dos entrevistados afirmaram não ler a bula e nenhum deles conseguiu explicar corretamente o significado de pelo menos cinco dos 14 pictogramas utilizados para instruir analfabetos sobre, por exemplo, o uso de máscara e luvas de proteção 9. E o risco de intoxicação não se restringe apenas aos trabalhadores rurais e seus familiares; utilizados incorretamente, os agrotóxicos contaminam a comida que vai para a mesa de toda a população. Para quantificar esse problema e alertar a população, em 2001, a Anvisa iniciou o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos, que busca identificar o excesso de químicos nos alimentos e o uso de agrotóxicos em culturas para as quais eles não são indicados. A avaliação de 2007 indicou que 45% das amostras de tomate, 43% das de morango e 40% das de alface apresentavam situação insatisfatória quanto à presença desses produtos 10. Processos de reavaliação ocorrem em todo o mundo e não são exclusivos do Brasil. Na Europa, a Diretiva 91/414/EEC criou um programa para rever sistematicamente as substâncias ativas usadas em agrotóxicos em circulação no mercado. Segundo essa diretiva, um produto deve ser aprovado por períodos não superiores a dez anos e o registro pode ser revisto a qualquer momento. Nos Estados Unidos, a Agência de Proteção Ambiental vem desenvolvendo um amplo programa de “re-registro”, uma revisão completa dos efeitos dos agrotóxicos sobre o meio ambiente e a saúde humana. São analisados aproximadamente 1.150 ingredientes ativos, organizados em 613 grupos de agrotóxicos. Nos últimos anos, 229 deles tiveram seu registro cancelado 11, uma demonstração de que esses instrumentos de reavaliação de agrotóxicos são fundamentais para evitar que os trabalhadores rurais, a população em geral e os ecossistemas corram riscos desnecessários. No Brasil, segundo o decreto nº 4.074/2002, “cabe aos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Saúde e do Meio Ambiente, no âmbito de suas respectivas áreas de competências [...] promover a reavaliação de registro de agrotóxicos [...] quando surgirem indícios da ocorrência de riscos que desaconselhem o uso de produtos registrados”. A iniciativa é muito importante, pois ao contrário dos medicamentos, o registro de um agrotóxico não tem prazo de validade. Portanto, somente a partir da reavaliação o governo pode retirar do mercado produtos obsoletos ou que já possuem substitutos menos tóxicos. A reavaliação de agrotóxicos no país vem sendo realizada pela Anvisa desde 2000 e prioriza aqueles produtos com toxicidade aguda ou com possibilidade de causar danos no longo prazo, como câncer e má formação fetal. Até este ano, a reavaliação era discutida e acompanhada por representantes da Anvisa, do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), do Ministério da Agricultura, do SINDAG e da comunidade científica. A partir de julho de 2008, com a publicação da RDC 48/2008 pela Anvisa, um novo procedimento foi adotado: a comissão de avaliação passou a ser formada apenas por representantes da Anvisa, Ministério da Agricultura e Ibama, e foram incluídas consultas e audiências públicas, permitindo assim que membros da sociedade como um todo possam participar do processo. Durante a reavaliação, um produto não é necessariamente proibido: dependendo das informações obtidas pela Anvisa, o registro do agrotóxico pode ser mantido, alterado ou suspenso. Em casos extremos a solução obviamente é o seu cancelamento. Para 2008, a Anvisa havia programado a reavaliação de 14 substâncias escolhidas principalmente com base na literatura científica existente, bem como nas novas restrições estabelecidas no cenário internacional. Desse total, o SINDAG conseguiu, com a liminar obtida na justiça, interromper a reavaliação de nove princípios ativos (triclorfom, parationa metílica, metamidofós, fosmete, carbofurano, forato, endossulfam, paraquate e tiran). O quadro abaixo resume a situação de três desses agrotóxicos.
PRODUTOS PERIGOSOSMETAMIDOFÓSRegistrantes: Agripec/Nufarm (Austrália), Arysta (Japão), Bayer (Alemanha), Cheminova (Dinamarca), Fersol (Brasil), Milenia/Makteshim Agan (Israel), Sipcam Isagro (Itália).Riscos: toxicidade aguda. Nos seres humanos super-estimula o sistema nervoso, causando náusea e confusão. Sob exposição elevada, pode induzir parada respiratória e morte. Situação na Europa: reavaliado em 2006, teve seu uso permitido somente em plantação de batatas até 2008, quando passaria por nova reavaliação.Situação no Brasil: em 2004 foi o inseticida mais usado no país, sendo permitido no cultivo de algodão, amendoim, batata, feijão, soja e tomate.ENDOSSULFAMRegistrantes: Agripec/Nufarm (Austrália), Agricur/Makteshim Agan (Israel), Bayer (Alemanha), DVA (Alemanha), Milenia/Makteshim Agan (Israel), Nortox (Brasil), Sipcam Isagro (Itália)Riscos: toxicidade aguda e cancerígeno. Em animais, foi observada intoxicação do sistema nervoso e do sistema endócrino. Situação na Europa: proibido em 2005 com a decisão 2005/864/EC da Comissão das Comunidades Européias.Situação no Brasil: em 2004 foi o segundo inseticida mais usado no país, sendo permitido no cultivo de algodão, cacau, café, cana-de-açúcar e soja.PARATIONA METÍLICA Registrantes: Agripec/Nufarm (Austrália), Action (Brasil), Cheminova (Dinamarca), Prentiss (Brasil), DuPont (EUA), De Sangosse (França)Riscos: toxicidade aguda. Causa distúrbios no sistema nervoso.Situação na Europa: proibido em 2003 com a decisão 2003/166/EC da Comissão das Comunidades Européias.Situação no Brasil: em 2004 foi o quarto inseticida mais usado no país, sendo permitido no cultivo de algodão, alho, arroz, batata, cebola, feijão, milho, soja e trigo. Ao invés de apoiar o processo de reavaliação, que busca reduzir a exposição da população a diferentes produtos de alta toxicidade, as empresas ligadas ao SINDAG opuseram-se à movimentação da Anvisa. Dessa forma, de acordo com a decisão nº 69/2008 do Juiz Federal Substituto da 13ª Vara do Distrito Federal, e “a fim de evitar qualquer dano às empresas”, foi determinado que a Anvisa se abstivesse de suspender ou restringir a comercialização de diversos agrotóxicos, até que a regularidade formal da reavaliação fosse analisada. Em outras palavras, por questões formais, a justiça vem adiando ações que poderiam evitar a intoxicação de muitas pessoas. Embora representantes do SINDAG afirmem que o sindicato “não quer impedir a reavaliação dos agrotóxicos” 12, novamente seu discurso parece incoerente com a prática das empresas. Em abril de 2008, a companhia japonesa Arysta conseguiu um mandato de segurança que obriga a Anvisa a manter o registro dos agrotóxicos produzidos a partir do acefato 13, um produto proibido na Europa desde 2003. Em julho, a italiana Sipcam Isagro entrou na justiça com um pedido de anulação do processo de reavaliação da cihexatina, numa tentativa de impedir que a Anvisa publique as restrições a esse agrotóxico 14; o uso desse produto foi cancelado na Europa em abril deste ano. De acordo com pesquisa divulgada nos fóruns de saúde ambiental, ações dessa natureza também vêm sendo utilizadas em outras localidades da América Latina. Na América Central, desde 1997, empresas do setor vêm participando das negociações sobre a unificação aduaneira na região. Essas companhias defendem e fazem lobby pela criação do Registro Único de Agrotóxicos, um mecanismo que estabeleceria uma “equivalência” de todos os sistemas de registro nacionais, independente dos seus graus de exigência. Por meio desse sistema de “harmonização”, quando um produto fosse registrado em um país, ele poderia circular livremente por toda a região, independente de proibições feitas pelas demais nações 15. Dessa forma, o comportamento dessas empresas desperta muitas questões que dificilmente poderiam ser respondidas a partir de uma perspectiva de responsabilidade corporativa: qual o real interesse e motivação das companhias associadas ao SINDAG quando decidem adiar o processo de reavaliação, cujo objetivo é proteger a saúde da população? Não deveriam as companhias que já possuem produtos substitutos menos tóxicos apoiar a Anvisa no banimento de agrotóxicos obsoletos? Como avaliar eticamente empresas que vendem no mercado global produtos que foram banidos em seus países de origem? Como conseqüência das ações das empresas associadas ao SINDAG, a Anvisa vem sendo impedida de realizar uma de suas atribuições fundamentais: proteger a saúde da população. Nesse contexto, é fundamental que seja amplamente divulgada à sociedade essa tentativa das indústrias, inclusive grandes transnacionais, de dificultar a atuação reguladora dos órgãos de saúde pública. Também o poder judiciário não pode permitir que uma medida ligada à garantia do direito à saúde dos cidadãos brasileiros seja flexibilizada em nome do interesse privado de empresas cujas atividades têm resultado em intoxicação de trabalhadores, contaminação de ecossistemas e diminuição da qualidade de nossos alimentos. À Anvisa deve ser garantido o poder de regular os agrotóxicos no Brasil e à sociedade o direito de participar e decidir sobre a utilização desses venenos no seu cotidiano. Além disso, esta discussão traz à tona outra maior: o modelo agrário baseado em monoculturas para exportação e a necessidade de alternativas de transição agroecológica, que apontem para um modelo eficiente que seja ao mesmo tempo socialmente justo e ambientalmente sustentável. * Texto publicado no Le Monde Diplomatique Brasil, em setembro de 2008, sob o título Os agrotóxicos e a força das multinacionais. ** Bruno Milanez e Marcelo Firpo de Souza Porto são pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ); Jean-Pierre Leroy é assessor da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE), Julianna Malerba é técnica da FASE; Jeffer Castelo Branco e Marcio Antonio Mariano da Silva são membros da Associação de Combate aos Poluentes (ACPO); Zuleica Nycs é membro da Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte (APROMAC) e Michael Søgaard Jørgensen é professor da Universidade Técnica da Dinamarca. Os autores são membros do GT Químicos da Rede Brasileira de Justiça Ambiental.*** Durante a edição desse boletim, recebemos a excelente notícia de que foi revogada a liminar que impedia a ANVISA de reavaliar os agrotóxicos, impetrada pelo SINDICATO NACIONAL DA INDÚSTRIA DE PRODUTOS PARA DEFESA AGRÍCOLA - SINDAG. Acesse aqui a sentença.Notas1 Invertia. “Brasil caminha para liderar uso de defensivo agrícola”, disponível em http://br.invertia.com/ 2 ABIQUIM. “A indústria química brasileira em 2007”, disponível em http://www.abiquim.org.br/ 3 L.O.M. Velasco e L.X.L. Capanema, “O setor de agroquímicos”, BNDES Setorial 24, 20064 Instituto Ethos, “Perguntas freqüentes”, disponível em http://www.ethos.org.br5 CEBDS, “Missão”, disponível em http://www.cebds.org.br. 6 SINDAG, “Institucional”, disponível em http://www.sindag.com.br/. 7 SINITOX, “Casos registrados de intoxicação humana e envenenamento. Brasil, 2006”. Disponível em http://www.fiocruz.br/sinitox/2006/brasil2006.htm 8 Frederico Peres, Brani Rozemberg, Sérgio Rabello Alves et al., “Comunicação relacionada ao uso de agrotóxicos em região agrícola do estado do Rio de Janeiro”, Revista Saúde Pública n° 35, 2001.9 A.V. Waichman, E. Eve, N.C.S. Nina, “Do farmers understand the information displayed on pesticide product labels? A key question to reduce pesticides exposure and risk of poisoning in the Brazilian Amazon”, Crop Protection, 2007.10 ANVISA, Programa de análise de resíduos de agrotóxicos em alimentos, 2007. Disponível em http://www.anvisa.gov.br/toxicologia/residuos/index.htm.11 EPA, Pesticide Reregistration Facts, disponível em http://www.epa.gov/pesticides/reregistration/reregistration_facts.htm. 12 Edson Pereira Filho, “Anvisa tenta retomar controle de agrotóxicos”, Folha de Londrina, 21/07/08.13 Tribunal Regional Federal do Distrito Federal. Consulta Processual – Processo nº 2007.34.00.042525-4, disponível em http://www.trf1.gov.br/ 14 Tribunal Regional Federal do Distrito Federal. Consulta Processual – Processo nº 2008.34.00.022395-5, disponível em http://www.trf1.gov.br/ 15 E. Rosenthal, “Who´s afraid of national laws? Pesticide corporations use trade negotiations to avoid bans and undercut public health protections in Central America”, International Journal of Environmental Health, 2005.

Fonte:
Agrotóxico na Terra dos Outros é Refresco. Disponível em:http://www.justicaambiental.org.br/_justicaambiental/pagina.php?id=2204 Acesso: 19 nov 2008.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Entrevista com Dr. Alex Augusto Gonçalves

Dr. Alex Augusto Gonçalves é Coordenador do Grupo de Interesse em Pescado e me concedeu a entrevista abaixo.

1 - O que é GI-Pescado?
O Grupo de Interesse em Pescado é uma rede brasileira de profissionais que atuam na área de ciência e tecnologia do pescado, dentre eles estão pesquisadores de universidades e instituições de pesquisa, profissionais que atuam no setor de controle de qualidade e pesquisa e desenvolvimento de empresas de pescado, fiscais federais do Ministério da Agricultura, técnicos da SEAP/PR, alunos de graduação e pós-graduação, além de empresários do setor.

2 - Quando teve início o GI-Pescado?
O Grupo de Interesse em Pescado – GI-Pescado, teve sua origem no Grupo de Pesquisa em Tecnologia do Pescado da Sociedade Brasileira de Ciência e Tecnologia de Alimentos (SBCTA) criado a mais de dez anos com o objetivo de reunir os diversos profissionais que atuam dentro da área de Ciência e Tecnologia do Pescado para troca de idéias, informações, discutir suas pesquisas, promover eventos dentro da área, etc.

Os coordenadores do GT-Pescado e depois GI-Pescado foram:
Biênio (GI-Pescado): 2009/2010: Alex Augusto Gonçalves
Biênio (GI-Pescado): 2007/2008: Alex Augusto Gonçalves
Biênio (GI-Pescado): 2005/2006: Alex Augusto Gonçalves
Biênio (GI-Pescado): 2003/2004: Alex Augusto Gonçalves
Biênio (GT-Pescado): 2001/2002: Alex Augusto Gonçalves (extra-oficial)
Biênio (GT-Pescado): 1999/2000: Walter Maia
Biênio (GT-Pescado): 1997/1998: Walter Maia
Biênio (GT-Pescado): 1995/1996: Marília Oetterer
Biênio (GT-Pescado): 1993/1994: Marília Oetterer
Biênio (GT-Pescado): 1991/1992: Marília Oetterer

Em virtude do distanciamento entre os profissionais, as reuniões eram feitas apenas a cada dois anos durante o Congresso Brasileiro de Ciência e Tecnologia de Alimentos (CBCTA). No ano de 2000, quando teríamos a tradicional reunião do GT-Pescado durante o CBCTA em Fortaleza (CE), por algum motivo a mesma não ocorreu. Assim, após algumas conversas com ex-coordenadores do GT-Pescado, eu decidi fazer uma reformulação na maneira de aproximar os profissionais da área e manter uma comunicação constante com os mesmos. Primeiramente optou-se por efetuar todos os contatos via internet e iniciar o cadastramento dos profissionais que tinham interesse em participar, que felizmente isso vem acontecendo até hoje.
Para iniciarmos uma nova etapa de trabalho, decidi mudar o nome do GT-Pescado para “Grupo de Interesse – Pescado”, o qual foi aprovado por unanimidade durante do CBCTA em 2002 (Porto Alegre, RS). Nesse novo grupo, não só apenas os que trabalham na área de Ciência e Tecnologia do Pescado se cadastrariam, e sim, todos àqueles que tenham algum interesse específico dentro da área de pescado.
Depois construi a homepage do GI-Pescado, mesmo que provisório e com constantes atualizações, e lá encontram-se uma listagem dos profissionais cadastrados, relação dos grupos de pesquisa, eventos dentro da área, links, Boletim – O Inspetor de Pescado (INFOPESCA), etc..
3 - Qual é o objetivo desse Grupo?

Divulgar os conhecimentos de ciência e tecnologia do pescado entre os colegas cadastrados no grupo.

4 - Qual é a importância do fórum para o GI-Pescado?
O fórum foi criado para facilitar a troca de informações entre os colegas cadastrados no grupo. Todos os profissionais que encaminharam sua ficha cadastral ao coordenador teve seu e-mail cadastrado automaticamente no fórum. Todos aqueles que desejam encaminhar uma sugestão ou dúvida, envia diretamente uma mensagem para gipescado@grupos.com.br.

5 - Quais são as metas do Grupo para o próximo o ano de 2009?
Continuar o trabalho que vem sendo feito e tentar buscar uma maior divulgação do grupo entre as entidades de pesquisa que atuam na área de ciência e tecnologia do pescado. O GI-Pescado é o “braço direito” da “Red Panamericana de Inspección, Control de Calidad y Tecnología de Productos Pesqueiros (RED-PAN)” aqui no Brasil, e como Diretor da área de Tecnologia da RED-PAN, tenho como meta fortalecer os dois grupos e tentar de alguma forma uma integração entre os três setores: universidade, empresas, instituições governamentais. Muita coisa ainda deve ser feita, como melhoria no website (ter um domínio próprio e mais espaço para disponibilizar imagens, vídeos, etc.), busca de mecanismos que permitam uma maior sintonia entre os pares no sentido de não dispersar pesquisas nas diferentes entidades, partindo para a elaboração conjunta e multi-institucional de projetos temáticos. Aproveitar os eventos científicos para promover reuniões do GI-Pescado e a sua divulgação.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Áreas de ponta sofrem falta de pesquisadores

Estudos em áreas como biodiversidade e mudanças climáticas esbarram em déficit de pessoal qualificado Outro gargalo competitivo que começa a se formar com o aumento dos recursos para ciência e tecnologia no Brasil é a falta de cientistas qualificados em algumas áreas estratégicas de pesquisa para o País, como mudanças climáticas, bioenergia e biodiversidade. À medida que cresceu a economia do País nos últimos anos, cresceu também a demanda por novos conhecimentos e novas tecnologias em todos os setores.“Mesmo 10 mil doutores por ano é pouco para tudo o que a gente quer fazer”, diz o biólogo molecular Marcos Buckeridge, da USP, que trabalha em uma das áreas mais competitivas da ciência brasileira na atualidade: a produção de biocombustíveis.Ele conta ter dificuldades para encontrar bons cientistas em bioinformática e fisiologia vegetal para trabalhar no Bioen, um projeto de R$ 73 milhões lançado recentemente pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), em parceria com o governo federal, governo de Minas e o setor privado. “Acho que não teremos gente suficiente. Precisamos absorver tudo que temos aqui e, ainda assim, é provável que teremos de trazer gente de fora.”A escassez de cérebros também começa a ser sentida na área de pesquisas climáticas, cruciais para a produção agrícola e a conservação ambiental. Só a Fapesp planeja injetar R$ 100 milhões em estudos sobre mudanças climáticas nos próximos dez anos, mas o especialista Pedro Leite da Silva Dias sente dificuldades para encontrar pesquisadores qualificados no tema, que exige treinamento multidisciplinar extenso.“Não vamos ter equipes de primeira linha em todas as áreas imediatamente. Entre tomar a decisão de investir numa área e ter pesquisadores formados leva tempo”, afirma Dias, diretor do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC) e professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP.O Brasil tem cerca de 200 mil pesquisadores trabalhando diretamente com pesquisa e desenvolvimento - mais de 70% deles alocados em escolas de ensino superior, segundo dados do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). É muito pouco, dizem os especialistas.O País está entre os dez que mais formam doutores no mundo, mas a proporção de titulados em relação à população ainda é baixa, como mostra um estudo recente organizado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE). Quando se considera o número de doutores por 100 mil habitantes, a posição do País cai de 10º para 27º num grupo de 34 países.“França e Espanha formam mais ou menos o mesmo número de doutores que nós, com um terço da nossa população”, diz o presidente do CNPq, Marco Antônio Zago. “O sistema ainda tem muito espaço para crescer”, completa o ministro de Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende.No limiteDepois de um crescimento explosivo nos últimos 20 anos, a capacidade do sistema acadêmico de formar doutores parece estar perto do limite. Segundo Rezende, o País dificilmente atingirá a meta de formar 16 mil doutores por ano em 2010, como previsto no Plano Nacional de Pós-Graduação. Uma das causas pode ser a falta de estudantes qualificados.“Há uma certa saturação em termos de matéria-prima e do próprio sistema”, diz o ministro. O número de novos alunos matriculados em cursos de doutorado sofreu uma queda brusca entre 2003 e 2004 (de 11.343 para 9.623) e só no ano passado voltou ao patamar dos 11 mil, segundo informações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação. Os números de 2008 ainda não estão disponíveis.“Não há dúvida de que a pós-graduação precisa dar um novo salto significativo na formação de doutores, principalmente em áreas aplicadas, como a engenharia”, afirma Eduardo Viotti, pesquisador visitante do Centro de Estudos Brasileiros da Universidade Columbia, em Nova York, que foi um dos autores do estudo do CGEE.Historicamente, segundo ele, a expansão do sistema foi no sentido de formar doutores para a própria academia. Não houve ênfase na formação de especialistas com perfil voltado para a inovação tecnológica e a pesquisa de ponta, que é o que o País precisa agora.Contratação difícil“Falta muito cientista”, reforça o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Marco Antonio Raupp. “Precisamos formar mais gente e abrir mais vagas de trabalho para que esses novos talentos possam ser contratados. Hoje temos uma evasão de jovens, porque o sistema não consegue absorvê-los.”Segundo o estudo do CGEE, dos 40.271 doutores formados no País entre 1996 e 2003, 64% estavam formalmente empregados em 2004 - a maior parte na área de educação. Falta saber o que aconteceu com os outros 36%.Segundo Viotti, é provável que muitos estejam fazendo pós-doutorado - ou seja, sobrevivendo à custa de bolsas - ou trabalhando como professor visitante, o que não conta como emprego formal. “Isso não é necessariamente ruim, desde que seja uma fase na vida do profissional”, diz. “Mas, se tudo que o pesquisador consegue ao fim do doutorado é um emprego informal, certamente isso compromete a evolução do sistema.”Especialistas defendem não só a abertura de vagas como uma revisão das regras de contratação de pesquisadores, de modo a facilitar a absorção de novos talentos - e eliminar cientistas improdutivos do sistema.Fapesp vai em busca de cérebros no exteriorA Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) deve colocar nas próximas semanas um anúncio de emprego na revista britânica Nature - uma das mais influentes no mundo da ciência - à procura de pesquisadores estrangeiros interessados em trabalhar com biocombustíveis no Brasil.A proposta é atrair talentos de outros países para reforçar o Programa Fapesp de Pesquisa em Bioenergia (Bioen), lançado em julho, com aporte de R$ 73 milhões.“É um sinal de que o Brasil está entrando no mercado mundial de ciência e tecnologia para competir pelos melhores pesquisadores disponíveis”, diz o pesquisador Marcos Buckeridge, do Instituto de Biociências da USP, um dos coordenadores do programa. “Estamos passando de fornecedores para importadores de cérebros.”Anúncios desse tipo são comuns em revistas especializadas internacionais. Instituições, empresas, Estados e países fazem propaganda de sua infra-estrutura de pesquisa para atrair cientistas de determinadas especialidades. Nos Estados Unidos, grande parte dos pesquisadores é estrangeira.“Queremos incentivar a internacionalização”, diz o diretor científico da Fapesp, Carlos Henrique de Brito Cruz. “Não há razão para o Brasil ficar fora desse mercado. São Paulo tem atrativos de pesquisa que são perfeitamente competitivos com o que é oferecido em outros países.”Tradicionalmente no Brasil, as agências de fomento só fornecem dinheiro para bolsas nominais, em que o aluno já foi selecionado para o projeto. Desde o início do ano, a Fapesp reverteu essa equação: projetos temáticos já incluem dinheiro reservado para bolsas, que pode ser usado como “isca” para atrair pesquisadores de outros países. A única exigência é que o coordenador do projeto publique um anúncio mundial de concorrência para a vaga.

Fonte:
Áreas de ponta sofrem falta de pesquisadores. Jornal da Ciência. Acesso em: 03 nov 2008. Disponível em: http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=59671